2.05.2012

Se te criei não sei



Se te criei não sei
nem se te quero assim
nem se é de ti que falo imagem que contemplo ou imagino
ou falo só de mim

As cores que antes espalhei e apaguei
sob outras cores em vão chamadas tão intensas sempre voltam
que em seu rumor afogam
tudo o que em volta ainda há ou houve ou haveria

Na floresta de lume quero ver bem e despegar-te
de mim mesmo e definir-te e definir-me e entender
onde este mudo apelo acaba e principia
Saber enfim não mais esperar-te ou inventar-te ou modelar-te
serena turva imagem destes dias sem destino
deles mesmos tecida em morte ou recomeço

E apenas sei
que em teus olhos sem cor feitos de mágoas e de mudança
luz um país que não vê e onde me vejo
e ao meu desejo inda para lá de todo o desespero e toda a esperança
num outro eu amanhecendo

Apenas sei sabendo que não sei
que é tempo de me ver para não te ver E cego só entendo
que neste halo a que me rendo ou eu mesmo entreteço
só não me vendo deixaria
de ver-te aqui de minhas mãos nascendo


Mário Dionísio